Por Fábio Lazzari*
O que é ex libris?
Ex libris (Lat. "dos livros") - Uma locução (expressão) latina que significa literalmente dentre os livros de fulano); dos livros de; fazendo parte dos livros; retirado dos livros; da biblioteca ou livraria de (neste sentido, o mesmo que ex bibliotheca).
Palavras latinas usadas na fórmula de indicativo de posse bibliográfica; a própria marca bibliotecária, escrita ou desenhada, de posse que antecede o nome do dono (a pessoa a quem pertence ou pertenceu o livro); designação destes sinais (títulos, siglas bibliográficas) de propriedade que se colocam dentro dos livros; por extensão, o nome das pequenas estampas, selos ou vinhetas usadas para marcar a posse dos livros; uma coleção destas vinhetas; o plural e coletivo de ex libris.
O Ex-libris da Biblioteca Pública do Estado do RS.
Criado por Eugênio Latour ( Rio de Janeiro, 1874-1942 ).
Pintor especialmente de paisagens, de gênero e de retratos e gravador em metal e madeira. É o autor do quadro "A Praga Social", no qual mostra a miséria moral do alcoólatra perante sua família. Este quadro localiza-se na sala que antecede ao salão Mourisco, no segundo andar da Biblioteca Pública do Estado.
Latour concebeu este Ex-Libris especialmente para a Biblioteca Pública, quando aqui residiu nas décadas iniciais do século XX, onde se observa a Esfinge (peça em pedra gres existente na BPE) e a cidade de Porto Alegre ao fundo.
Curiosidades sobre o ex-libris
De uma simples tira de papel impressa com o nome do possuidor (nas bibliotecas dos conventos portugueses, por ex.), ganhou figuração heráldica e, mais tarde, feições alegóricas e simbólicas de grande valor artístico como a expressão de uma forma de arte em miniatura muito em voga desde o Renascimento europeu do século XVI.
O ex-libris passou a ser um objeto de estudo especializado, classificando-se por estilo, temática, época...Por exemplo, ex-libris com motivos heráldicos, românticos, paisagísticos, humorísticos, etc. Os heráldicos reproduziam os brasões e as armas do proprietário do livro identificando-o assim até a olhos iletrados. O portrait ex-libris retratava as feições do dono ou da madona. Sucederam-se, conforme a moda, época e período: retratos, cenas em bibliotecas, paisagens bucólicas, alegorias, os ex-libris com símbolos das profissões liberais...
Os ex-libris de fundo alegórico generalizam-se na França de Luís XV e, mais tarde, na Inglaterra de meados do séc. XVIII, estampando personificações das principais virtudes cristãs e outras ideias abstratas como a dança da morte, o tempo, a sabedoria e a justiça. No fim do século XIX, os alemães passam a usar o nu como motivo de criação de ex-libris. Moda que foi seguida na Europa e Estados Unidos.
A "Revista Ibérica de Ex libris", que se publicava em Barcelona, durante os anos de 1903 a 1906, inseria, em uma de suas páginas, uma nota com o seguinte título: "Los ex libris en los tribunales". Era o caso de um ex-libris que decidiu uma questão em litígio nos tribunais da Espanha, depois de um processo judicial demorado e dispendioso...
Os ex-libristas brasileiros multiplicam suas coleções com variantes. Neste particular, o colecionador e aficionado brasileiro(a) leva vantagem sobre quaisquer outros praticantes do ex-librismo. São conhecidas pelo menos quatro variantes do ex-libris do Barão de Rio Branco que possuía mais um outro com o qual marcava a sua mapoteca.
["Variantes", são cópias diferentes que muitos bibliófilos possuidores mandam tirar dos seus ex-libris. Por exemplo, "variantes", em cores, em tamanho ou porque, por simples descuido no desenho e na impressão, saíram errados. As primeiras provas dos ex-libris (provas de escova), são consideradas variantes e figuram como exemplares raros, em muitas coleções. [Esteves, O Ex Libris, p. 119]
O ex-libris estava na moda em 1900 e era considerado de "bom tom" ter ex-libris e usá-los. Era uso na Alsácia fazer iluminuras nos livros como marca de posse e o calígrafo marcava o livro na última página com a data, o nome, arabescos e desenhos do proprietário ou proprietária.
Nos anos 80, Sílvio Duncan — o poeta gaúcho do Grupo Quixote (Porto Alegre, 1947 – 1960) fazia o mesmo, só que os seus ex-libris eram garatujados diretamente sobre a folha de rosto!
O primeiro ex-libris brasileiro — segundo o estudioso ex-librista Manuel Esteves — foi o de Manuel de Abreu Guimarães, rico possuidor de uma biblioteca na antiga cidade de Sabará (Vila Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabará do Rio das Velhas), Minas Gerais, no final do século XVIII. Presume-se que o mesmo tenha sido feito pelo padre José Joaquim Viégas de Menezes, pioneiro da arte de gravar em nosso país — responsável pela gravação e impressão de um livro antes da instalação da Impressão Régia no Brasil: "É uma bela alegoria às Artes, ao Comércio e à Indústria. Uma lira no centro. Ao lado um caduceu – que é a insígnia de Mercúrio – o deus do comércio. Pode-se ver também o tridente – o cetro do Rei dos Mares, Netuno. Em bonito cursivo caligráfico traz o nome do possuidor: Manuel de Abreu Guimaraens." [Esteves, p. 129-30]. A Biblioteca Nacional, no Estado do Rio de Janeiro, guarda o único exemplar conhecido do mesmo, além de diversas coleções de ex- libris brasileiros e estrangeiros. O ex-libris da Biblioteca Nacional foi criado em 1903, aliás, pelo artista Eliseu Visconti, responsável pela introdução do art-nouveau nas artes gráficas do País.
Uma regra geral: em um livro que antes pertenceu a alguém foi colado um ex-libris. O atual dono, ao colar o seu, deverá fazê-lo à direita do que encontrar. Isso se repetirá tantas vezes quantas tenha mudado o livro de dono. Esse livro, com alguns ex-libris diferentes, será muito interessante: no pequeno espaço necessário para as quatro ou cinco vinhetas, poderemos ver arte, costumes e religião de épocas diversas, pois tudo isso poderá caber em um minúsculo ex-libris.
Fontes Consultadas:
BIASOLI, Vitor. Grupo Quixote: história e produção poética. Porto Alegre: EDIPUCRS/IEL, 1994. 90 p. (Coleção Ensaios)
ESTEVES, Manuel. O Ex Libris, 2ª ed, Rio de Janeiro: Laemmert, 1956. 200p.
NOVA ENCICLOPÉDIA BARSA, Rio de Janeiro: Encyclopaedia Britannica do Brasil, 1997. v. 6. p. 166.
RATO, Fausto Moreira. Manual de Ex-Librística, Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1976, 238 p.+IV
VERBO ENCICLOPÉDIA LUSO BRASILEIRA DE CULTURA, Lisboa: Editorial Verbo, 1969, v. 8. p. 119-20.
Fábio Lazzari (historiador, trabalha no setor sobre o RS, da Biblioteca Pública do Estado).
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